Os negros e a escravidão em Dom Pedrito

Januário. Conta-se que viveu quase até 100 anos, algo raro para um escravo

 O tema, apesar de delicado, merece a nossa atenção, visto fazer parte da história da humanidade. Quando se diz escravidão, pode parecer que falamos de algo muito distante, mas infelizmente, este é um episódio muito recente da trajetória humana, e como não poderia ser diferente, o Brasil tem grande parte da sua vida baseada na escravidão de outros povos, notadamente os negros, onde o processo de abolição da escravatura foi gradual e começou com a Lei Eusébio de Queirós de 1850, seguida pela Lei do Ventre Livre de 1871, a Lei dos Sexagenários de 1885 e finalizada pela Lei Áurea em 1888. Dom Pedrito, não fugiu a essa regra, contando, também com a sua cota de participação no livro da sua história ,como passaremos a ver nas linhas seguintes.


Colaboração: Adilson Nunes de Oliveira - Diretor do Museu Paulo Firpo.
Peças e imagens ilustrativas: Acervo do Museu Pulo Firpo.

Obras consultadas: Memória do Teatro - Dom Pedrito, de Adilson N. de Oliveira; A Cidade de Dom Pedrito, de José Antonio Dias Lopes; De Escravo a Liberto, um difícil caminho, do Instituto Estadual do Livro, coordenação de Sandra Jatahy Pesavento.

Livro de classificação de escravos
 Os povos escravos haviam acompanhado os povoadores luso-brasileiros da região. Um dos primeiros sesmeiros a trazê-los, por volta de 1810, foi Antônio Garcez de Moraes. Mas a sua presença é discutível. No século XIX, Dom Pedrito não teve charqueadas nem grandes lavouras. O escravo era utilizado nas lides campeiras e nos serviços domésticos, sendo possível que eles pudessem ser substituídos pelos "gauches", que perambulavam através das estâncias da fronteira aberta. De qualquer modo, ele proporcionou uma certa comodidade a que a sociedade brasileira, desde os tempos coloniais estava acostumada. Por isso o número de escravos locais chegou a ser relativamente grande. Em 1858, entre os 8.132 habitantes de Dom Pedrito, havia, pelo menos 1/3 de negros. A população do Rio Grande do Sul, nesse ano era de 285.444 habitantes, sendo 71.911 escravos, 208.044 livres e 5.489 libertos.

 Nas estâncias, além de sua ocupação campeira, vigiada por um capataz ou feitor, o escravo homem desempenhava a função militar, na defesa da vida, do patrimônio do Senhor, e a qualquer momento poderia ser recrutado para lutar contra os castelhanos. Para Dante de Laytano, o negro encontrou na caserna o seu verdadeiro lar, nos combates, um meio de demonstrar sua energia. Usando um chapeu roto, vestindo um "chiripá" de fazenda grosseira, levando um "bichará" (espécie de Poncho), para enfrentar o frio e a geada, calçando botas de couro verde de vaca, empunhando a lança e a arma de fogo, ele partia sobre o único ser que lhe devia obediência: o cavalo. Montado, o negro sentia-se parecido com o branco.

 Às mulheres escravas estavam reservados os serviços domésticos, eram cozinheiras, mucamas, copeiras, lavadeiras, engomadeiras, costureiras ou simplesmente recebiam a qualificação particular de negras de todo o serviço. Como aconteceu em outros pontos do Brasil, algumas delas também preenchiam a função de concubinas dos senhores e de seus filhos. Os primeiros cruzamentos entre brancos e negros fizeram-se nos confins dos cercados e no chão batido das senzalas. A mucama, escrava de estimação, tinha acesso direto à senhora. Arrumava seu quarto, auxiliava-a no banho, apertava-lhe o espartilho, cuidava de suas roupas, lavava e penteava seus cabelos, acompanhava-a nas visitas a parentes, comadres e amigos, cuidava de seus filhos menores. Fazia parte do dote das moças casadoiras e, se fosse o caso, desempenhava o papel de ama de leite. Como toda regra, porém, havia exceções a essas duas classificações: alguns homens executaram, trabalhos convencionados como privativos das mulheres e vice-versa. Existia, em Dom Pedrito, escravos artesãos: o preto Manuel, escravo de Francisco Antonio Pinheiro, fabricava com requinte botas de qualquer tipo e tamancos comuns e volteados. O preto Antonio, escravo de Domingos Moreira da Fontoura era alfaiate.

 Os casamentos e ajuntamentos entre os negros eram estimulados pelos senhores. Havia um certo respeito pela sua vida familiar: tinham filhos livremente, quantos quisessem. Em princípios da década de 1870, um terço dos escravos municipais era formado por crianças. Enquanto não exerciam uma ocupação fixa, o negrinho e a negrinha auxiliavam os mais velhos em serviços leves, ou faziam mandaletes. Um escravo não custava importância que se pudesse desprezar. No inventário por morte de Bernardino Ângelo da Fonseca, realizado provavelmente em 1870, o escravo Ventura, com 19 anos, foi avaliado em um conto e duzentos mil réis. Na mesma ocasião, um cavalo manso foi partilhado em treze mil e quinhentos réis. 

Confira a matéria completa na edição impressa de 4 de agosto.

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2 Comentários

Unknown disse…
Foi eu quem postou esta foto do Januário que viveu bem mais de 100 anos na estância de meu avô. E ele não foi escravo e sim filho de escravo.
Folha da Cidade disse…
Olá Cláudio. Obrigado pela informação. O professor Adilson , diretor do Museu gostaria de falar contigo a respeito disso. Pode me passar o teu celular para ele entrar em contato?